Cont.1 (...) 16 Dezembro de 1975

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O negro deste país, aquele que trabalha e tem noção honesta da vida, reconhece a superioridade técnica do branco e desejaria uma Angola multi-racial governada por pretos e brancos na medida das aptidões de cada um. De principio, necessariamente que a governação seria dominada pelos brancos mas, criadas as condições para a promoção igualitária dos negros, pouco a pouco o elenco governativo se iria modificando no sentido da proporcionalidade étnica.

Se a questão tivesse sido posta à apreciação popular por meio de plebiscito (mesmo internacionalmente fiscalizado), poucas dúvidas tenho de que Angola, embora desejasse autonomia, não pretendia separar-se inteiramente de Portugal. E sobretudo não se levantaria o aspecto rácio, já que os brancos eram naturalmente integrantes da sociedade angolana.
Evidentemente que haveria discordantes, mas em minoria tão ínfima da sociedade angolana.

É que os Movimentos de libertação (de inicio ditos terroristas) não tinham representatividade popular apreciável. Nenhum deles. Formados nos países limítrofes por indivíduos ambiciosos de poder, não se identificavam com o povo, a quem eram indiferentes essas ambições. Era patente, que esses Movimentos não lutavam por mor do povo, antes com mira no poder. Na generalidade o povo não lhes dava apoio e a colaboração que muitas vezes lhes prestava era sacada por intimidação.

Mas o espírito do 25 de Abril rapidamente evoluiu. Foi escamoteado. E não tardou que essa evolução se espalhasse em Angola: os Movimentos ganharam animo... ganharam também pendor racista.

Já não importava apenas a independência do território, mas também a expulsão dos brancos. E este objectivo serviu às maravilhas para catequizar o povo. Que mais aliciante que prometer à população inculta a casa do branco, o automóvel do branco, as roupas e o deposito bancário do branco ( e até a mulher ou a filha do branco, como alguns caciques ousaram arriscar) ?

Claro que isto foi possível graças ao ambiente propicio que a situação política de Portugal criou. Portugal nem sequer escondia a pressa que tinha em se descartar do Ultramar. Era necessário, imperioso, entregar rapidamente os territórios de África, antes que uma, sempre possível, reviravolta impedisse ou retardasse essa entrega. Estava em jogo o interesse da expansão soviética, e a URSS não podia arriscar perder essa oportunidade.

O processo de autonomia não corria, porém, com a celeridade desejada, mau grado os esforços de uns quantos. Havia que neutralizar o empecilho que teimava no referendo popular sobre a auto-determinação. E o presidente Spínola foi afastado (habilidosamente, diga-se). A via estava livre. Não mais auto-determinação, plebiscito e outras coisas reaccionárias. O povo não sabe o que quer, não sabe o que mais lhe convém.
Mas a via não estava, afinal, inteiramente livre.

Os Movimentos eram três e não pensavam do mesmo modo, ainda que fossem unânimes quanto à entrega pura e simples de Angola. Mas a entrega que não fosse só ao MPLA, como já antes se havia tentado, defraudava os interesses soviéticos, por encaminhar o país para outra linha.

Afinal, não bastou afastar Spínola; era preciso por à frente de Angola quem, calculada e persistentemente, preparasse o ambiente que facilitasse a entrega só ao MPLA, ao mesmo tempo que, por todas as formas, robustecesse este Movimento (que então tão carecido estava disso).

E surgiu o Almirante Rosa Coutinho, recentemente promovido por mérito político e, de há longa data, conhecido como, pelo menos, cripto-comunista.
Rosa Coutinho não se quedou contemplativo; formou um Governo congraçando os 3 Movimentos (era preciso proteger as aparências) rodeou-se de Secretários de Estado sem Pasta, facilmente manobráveis ou que convinha controlar de perto, como foi o caso do Eng.º Fernando Falcão de quem adiante se falará.

(continua)