Lobito 6 Dezembro de 1975

As emissoras de rádio estrangeiras informaram há dias sobre a intervenção da URSS na guerra de Angola e sobre a advertência feita por Kissinger. Os países da OUA também condenaram aquele auxilio, levantando-se até certos atritos diplomáticos.
Ora já não é a primeira vez que a URSS se intromete em países africanos e não houve a reacçao de guerra. é que desta vez a intervenção é directa, diz-se.
Mas em pureza ética, intervenção é sempre intervenção, seja qual for a habilidade de meios que utilizam.
A meu ver a explicação será outra: conveniência diplomática em lhe dar publicidade ou em não denunciar essa intervenção. Quantas vezes todo o mundo conhece uma ingerência noutro país e ninguém se apressa a denuncia-la publicamente. Portanto, não serão tanto os meios usados na intervenção os idóneos para classificar de directa ou indirecta, antes a maior ou menor publicidade que lhes convirá dar.
Neste caso, a intervenção soviética é, pois, directa.

Paralelamente, quanto à intervenção da África do Sul a questão põe-se de outra maneira. Este país nega, e os dois Movimentos por ela apoiados negam, que haja uma ingerência directa. No entanto é incontestado  que elementos sul-africanos lutam em Angola. Simplesmente (por enquanto) parece que se trata de voluntários e não de tropas do exercito regular daquele país. Claro que é sempre fácil dar-lhe este aspecto.
Mas seja como for, nos países da OUA já se levantam clamorosos protestos contra o facto. E talvez mais clamorosos do que contra a intervenção soviética, embora tais países repudiem o comunismo. É que a África do Sul é um país do "apartheid" que nenhuma nação, designadamente africana, tolera.
Certamente não se importariam que esse auxilio viesse dos USA, ou da França, ou da Alemanha Federal, mas a África do Sul, nunca.
E a aversão é tão grande que certos países, pendentes em principio para a FNLA ou UNITA, já denotam querer mudar para o quadrante do MPLA, apenas para marcarem posição contra a África do Sul. A ajuda sul-africana é extremamente valiosa para as cores FNLA/UNITA, mas talvez lhes tire um pouco da simpatia que por eles inicialmente manifestaram esses países.

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Chegou-me há dias a noticia de que seis cargueiros soviéticos descarregaram, no porto de Luanda, grande quantidade de material de guerra, em que avultavam tanques, artilharia pesada, aviões, possivelmente misseis e outras armas sofisticadas. Deve ser noticia de acreditar, pois seria excessiva coincidência que, alguns dias após, se tivesse desencadeado uma contra-ofensiva do MPLA para aliviar o cerco a Luanda, ofensiva que obteve pleno êxito graças a (diziam as emissoras) bombardeamentos que atingiram a saturação.