Lobito 16 Janeiro de 1976

Chega notícia de que as forças do MPLA teriam avançado ao longo do litoral Norte, tomando os portos de Ambriz e Ambrizete, e teriam estabelecido ligação, para o interior, com Carmona e Negage, cidades ocupadas há dias. Deste modo deixou de existir o perigoso corredor d penetração para se transformar em vasta área conquistada.

Quanto à FNLA, parece que abandonou todo o território que ocupava ao Norte, tendo-se refugiado na República do Zaire. E como também foi escorraçada das cidades do Sul pela UNITA (sua efémera aliada), não deverá ter agora presença em território angolano.
Mas é óbvio que tal não significa derrota definitiva, pois aquele Movimento em parte alguma se rendeu, apenas se retirou. E é natural que, possivelmente, esteja a reorganizar-se para contra-atacar, uma vez que, para já, conta com o incondicional apoio do Zaire e mantém alentadoras esperanças em melhor e mais eficaz ajuda dos EUA.

Deste modo, a situação actual quanto a território ocupado, será: O MPLA domina toda a faixa Norte numa área de talvez 2/5 do país; a UNITA ocupa o centro e todo o Sul, correspondentes aos restantes 3/5,
Indícios daqui e dali dão como lutando ao lado do MPLA  uns 7.000 cubanos, mais 4.000 catanguenses (ex-gendarmes do Catanga) e algumas centenas de soviéticos, alemães orientais e de outros países de Leste. Com a UNITA estarão uns 6.000 sulafricanos, cujas posições se têm mantido estáveis nas últimas semanas.

Segundo a Imprensa e Rádio internacionais largamente difundiram, a Conferência dos Estados Africanos da OUA redundou em fracasso (pelo menos aparentemente). Duas principais questões foram postas à apreciação e deliberação dos 46 membros que formaram a Conferência;
  1.ª - Reconhecimento do MPLA e do seu Governo como único e legítimo representante do Estado de Angola.
  2ª - (em oposição) Retirada de todo o auxilio de tropas estrangeiras e formação de um Governo Nacional com representaçºoes dos três Movimentos (aliás como retoma do espírito do Acordo de Alvor).

Qualquer das propostas obteve 22 votos contra, com 2 abstenções. Estes, depois do encerramento, decidiram-se uma para cada lado.
É curioso notar que, enquanto o grupo pró-marxista faz a proposta concreta de puro reconhecimento do Movimento do seu grupo (MPLA) como único possível, o grupo oposto não formulou proposta equivalente para os outros dois Movimentos. Um foi intransigente, querendo governar sozinho, pois só ele representaria a vontade da Nação; outro foi contemporizador, aceitando democraticamente representações de todas as cores na governação de Angola.

Resultado: Conferência nula, aliás previsível para quem conhece a tradicional intolerância dos que se arrogam (marxista) detentores da sua exclusiva "verdade revelada". E com isto a OUA terá dado um grande passo para a falência ou, pelo menos, para o descrédito.

Valha-nos saber que, deste jeito, se estremaram campos, e não surpreenderá se alguns destes países vieram para Angola "pelejar por sua dama", sobretudo os que devam "juros" à URSS.

Neste novelo de interesses e de ideologias há um facto para o qual não encontro fácil explicação, possivelmente por não ser iniciado em política internacional: é o caso dos votos da Tanzânia e de Moçambique a favor do MPLA. Sabido que o MPLA pertence ao clube moscovita, e sabendo-se também que Moçambique e Tanzânia têm sido auxiliados e orientados pela China, hoje rival de Moscovo, parece estranho que aqueles países pró chineses tenham dado o seu apoio ao Movimento da órbita russa e, o que mais, o tenham feito continuada e ostentativamente. Mistérios da diplomacia.

Quanto á África do Sul, a sua posição estará agora consolidada. Se é indubitado que a sua intervenção em Angola não terá sido segredo, desde o inicio, para as potências ocidentais, muitos países já dão aceitação ao facto, reconhecendo a utilidade daquela acção na luta contra o imperialismo soviético.
E nisso muito deve ter influído a repetida afirmação do Governo Sul-africano, e não desmentida, de que entrou na luta a pedido de um dos Movimentos e também a instâncias de alguns países africanos.
Verifica-se assim que a sua intervenção teve tanta legitimidade quanto a dos cubanos, com a atenuante de que a iniciativa não partiu da África do Sul.
Consta que o contingente cubano se eleva actualmente a passante de 9-500 soldados.