Lobito 1 Julho 1976

Grassa com intensidade e oficial entusiasmo a "Campanha do Café". Como já várias vezes foi aflorado, o preto angolano (e julgo que de quase toda a África negra) é pouco atreito ao trabalho; por ancestralidade (em muitas regiões a mulher, com o filho ás costas, é quem trabalha na "lavra"; o homem fica sentado à porta da cubata a fumar o seu cachimbo), por errada noção sobre as responsabilidades da independência e, finalmente, por se convencer que iria trabalhar para o MPLA e não gosta do MPLA nem da sociedade que este se propõe instaurar.

Mau grado as parangonas escritas e sonoras da Imprensa e da Rádio, os brancos em reuniões e comícios de que o MPLA é o povo e o povo é o MPLA, a realidade é que o povo, o verdadeiro povo, nunca se identificou com este Movimento.

Nas principais cidades ainda o MPLA lançou expressiva percentagem, designadamente em Luanda, em Benguela e talvez em Dalatando e Malange. Nas restantes cidades e principalmente nas zonas rurais está em fraca (ou fraquíssima) minoria. Aqui, domina apenas pelo medo que infunde.
Dia a dia se avolumam os indícios confirmadores.
A prova desta transparente realidade (se prova carecia) surgiu agora com a Campanha do Café. Quase todas as roças de café estão paralisadas, ou por abandono e sequente confisco, ou por falta de mão de obra.

Estamos na época da colheita e, se não for feita, perde-se-à um dos principais valores de exportação, principalmente num momento em que o país carece aflitivamente de divisas do exterior.
Assim, iniciou-se há semanas cerrada campanha de publicidade sob a palavra de ordem "Produzir é Resistir", convidando o povo a fazer a colheita, os resultados devem ter sido muito magros.
O povo parece que não lhe interessa "resistir".

Perante isto, as várias Comissões para o efeito constituídas têm desenvolvido intensa actividade aliciante, mas esbarram com geral indiferença.

Foi convocada à pressa uma incorporação de recrutas para prestação de serviço militar, cujos centros de instrução (pelo menos alguns) vão funcionar, por estranha coincidência, nos centro produtores de café.
A coincidência é tão evidente que é lícito suspeitar que a instrução militar irá começar por colher café. Mas há mais... e melhor.





CONTINUA...