Lobito 3 de Maio 1976

No passado sábado celebrou-se o 1º de Maio, Dia do Trabalhador.
Há semanas que as comissões se afadigavam na elaboração do programa para condigna comemoração, e as paredes dos prédios surgiram inundadas de cartazes alusivos.

No Lobito a campanha abriu uma semana antes com uma exposição denominada "O suor do Trabalhador" e algumas palestras e reuniões de mentalização.
Não sei que afluência tiveram estes actos mas presumo que, pelo menos, à exposição, deverá ter ido muita gente, pois o organismo sindical (UNTA) não se cansou de prevenir que, a quem não fosse visitar a exposição, ser-lhe-ia descontado nos vencimentos um dia de trabalho.

No 1º de Maio realizou-se o principal acto, que consistiu em grandiosa concentração de trabalhadores na Praça da Liberdade (ex-Praça Salazar). Do programa constava que, às primeiras horas da manhã, os trabalhadores deveriam reunir-se nos respectivos locais de trabalho e dali marcharem para a referida Praça, onde ouviriam então vários oradores. Foi anunciado também, e com insistência, que seria marcada falta injustificada a quem não comparecesse.

Apesar do dia ser proclamado feriado nacional, era intuito comparecer, pelo menos na Praça, para apreciar o que ali se passasse. Mas o aviso da sanção aos faltosos actuou como dissuasor e... não fui.
Todavia, parece que se alcançou o objectivo, porque alguns trabalhadores com quem, na véspera, contactei, não esconderam o temor de faltar e estavam, por isso, determinados a comparecer.

Não fui, mas contaram-me.
A meio da manhã formações de trabalhadores, por unidades laborais, desfilaram pelas ruas confluindo para a Praça. Outros, de mais longe, deslocaram-se em autocarros e camiões. Foram distribuídas pequenas bandeiras vermelhas, pelos participantes. Cada unidade laboral carreava símbolos das suas ferramentas e até máquinas locomóveis. Havia também profusão de painéis com legendas alusivas ou retratos de Carl Marx, de Lenine, de Chi Minh e de Agostinho Neto.

O discurso de circunstância foi proferido pelo dirigente local da UNTA, individuo conhecido pelas ideias ultra-esquerdistas. Seguiram-se vários oradores pretos falando ora em português ora em umbundu.
Em certa altura, como estes oradores não conseguiam prender a atenção dos circunstantes, vários grupos, julgando já ter cumprido a obrigação, começaram a debandar tomando as viaturas que os havia trazido. Porém, tomou-lhes o passo um militar do MPLA que os obrigou a regressar à Praça para assistência até final.

Foi, realmente, uma concentração e manifestação "espontânea". Mas tanto bastará para que jornais e emissoras transmitam ao mundo o êxito do cometimento.