Lobito, 16 Abril 1976

Em discurso proferido há uma ou duas semanas, o Presidente Agostinho Neto, reportando-se ainda à intervenção da África do Sul, anunciou que o Governo exigiu, ou vai exigir, uma indemnização àquele país pelos prejuízos causados à economia angolana.
Parece que não se referiu ás destruições causadas por actos de guerra, antes ao desmantelamento de unidades de produção e consequente remoção da aparelhagem e maquinaria.

Causou surpresa a referência, porquanto o exercito sulafricano sempre foi tido como correcto e altamente disciplinado, nunca constando que alguma vez os seus elementos tenham praticado alguma acção reprovável. De resto, nem a África do Sul, país industrialmente desenvolvido, carecia das quase incipientes indústrias de Angola, nem Angola tem indústrias cobiçáveis.
Contudo, chegou posteriormente ao meu conhecimento que no Sul, quando as forças sulafricanas retiraram para a suas fronteiras, alguns indivíduos civis, que nessa ocasião também abandonaram Angola sob a protecção daquelas tropas, teriam levado consigo alguma maquinaria de fábricas e oficinas. Precisou-se mesmo que um português conseguiu remover para Sudoeste Africano todas as máquinas de construção de estradas que constituíam o parque de máquinas da Junta Autónoma das Estradas, em Sá da Bandeira; este individuo, segundo a mesma fonte, estará presentemente a utilizar essas máquinas em empreitadas de construção naquele território.
Sendo assim não me parece que a África do Sul possa ter qualquer responsabilidade, pois o seu exercito não tinha funções de policia e procurou sempre manter-se alheio a questões internas.

O desvelo do Governo angolano quanto ao que os portugueses teriam levado clandestinamente de Angola, de sua pertença ou em compensação do que lhes foi arrebatado (e em todo o caso uma ínfima parte do que cá ficou), não se mostra análogo em relação aos cubanos. Com a sua aquiescência, espontânea ou forçada, os navios de Cuba têm carregado, em Luanda, automóveis, frigoríficos, aparelhos de climatização, rádios e milhentas coisas de utilidade doméstica, saídos das residenciais desabitadas dos brancos que debandaram.

No Lobito essa acção não se desenvolve tanto ás claras como parece acontecer em Luanda. Segundo o testemunho do tripulante de um navio português que, desde há semanas, se encontra atracado aos cais, os navios cubanos que têm vindo ao porto não mostram movimento durante o dia - todos os guindastes parados. Mas depois da meia note, quando todo o tráfego do porto se quedou e o seu pessoal abandonou a zona, começa a azáfama nesses navios em operação de carga realizada pelos seus próprios soldados. Ás 5 horas da manhã termina a faina para recomeçar, se necessário na noite seguinte.
A honestidade do informante não o aventura a afirmar qual a natureza desses carregamentos. Diz apenas que, por vezes durante o dia, os navios carregaram viaturas militares e material de guerra; mas, findos estes embarques, os navios continuam atracados sem qualquer movimento durante o dia e só alta noite se efectuam os embarques misteriosos.




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