Lobito 27 de Agosto 1975

Nesta zona há finalmente calma...por enquanto, pois a luta generalizou-se a todo o território.
O homem da rua (como eu) foi surpreendido pelo resultado dos acontecimentos militares, sobretudo dos últimos dois meses.
Em Janeiro tinha-se a noção de que, militarmente, as forças da FNLA seriam as mais importantes - em soldados, em armamento e em organização. Cônscias desse valor, eram as que mais se impunham. O MPLA e a UNITA procuravam esquivar-se a confrontações de violência e, na sua propaganda, nunca atacavam directamente um designado movimento. Era a fase da luta "palratória".
Designadamente a UNITA pugnava activamente pela paz, por um entendimento, pois todos previam a prazo certo confrontações guerreiras. E efectivamente não se esperou muito.
Áparte pequenos incidentes anteriores, em Abril desencadeou-se séria luta nos bairros suburbanos de Luanda entre a FNLA (de pendor mais ou menos, capitalista) e o MPLA (de feição comunista); a UNITA absteve-se e continuou a pregar a paz.
O pior nesta luta, como nas que se seguiram, não resultou propriamente da acção das forças armadas em presença, mas do vandalismo dos marginais e do chamado "poder popular".
O "Poder Popular" é uma organização ( melhor diria desorganização) de elementos do povo, armados, que actuam livremente sem obediência a planos ou a quer que seja. A sua função é destruir, saquear , matar, violar, criar confusão e terror.
A partir daí a luta alastrou para outros pontos do país e surpreendeu, então, o poder guerreiro do MPLA.  Cabe referir que, antes, houve um interregno de poucas semanas, fruto do Acordo da Nakuru (Quénia) promovido por Savimbi e onde todos os Movimentos se comprometeram a não usar da força e da violência.
Uma ou duas semanas volvidas o Acordo foi esquecido (tudo indica por iniciativa do MPLA)  e a luta prosseguiu. O MPLA mostrou então que não esteve inactivo nos últimos seis meses, se organizou com relativo primor no capo militar e ficou em posição de , de longe, poder enfrentar qualquer dos outros dois em material e formação militar. Não será  o mais numeroso mas é, sem dúvida, actualmente o melhor estruturado e até disciplinado. Diz-se que tem sido cuidadosamente instruído por russos, thecoslovacos, yugoslavos e cubanos. Mas Cuba não se limitou a entrar a enviar alguns instrutores; com este rótulo muitos cubanos integram as forças do MPLA como tropa de linha. Calcula-se que, nesta altura, já hajam alguns milhares de cubanos enquadrados nas FAPLA (Forças armadas do MPLA).
E assim caiu em Luanda em suas mãos seguindo-se Dalatando (ex-Salazar) e Malange. Depois Porto Amboim, Novo Redondo, Henrique de Carvalho (Saurimo). Logo a seguir, Lobito, Benguela; recentemente (ontem ) Sá da Bandeira e Mocãmedes.
Resta à FNLA os distritos do Norte (Zaire e Uige), que ocupa integralmente; para a UNITA ficaram os destritos de Bié e Huambo (no planalto central), onde se entrincheirou.
A luta no Lobito teve um aspecto curioso: grande parte da população (negra e até branca) pendia para a UNITA e FNLA; quando, no decurso dos combates, qualquer destes Movimentos alcança êxito parcelar, logo a noticia era transmitida com regozijo entre os civis; mas quando, finalmente o MPLA saiu vitorioso, a nova correu em surdina e toda a gente a recebeu cabisbaixa e em silêncio. Supoe-se que o mesmo tenha acontecido em outras terras do Sul, onde aqueles Movimentos (FNLA e UNITA) têm maior audiência.
Entretanto o que fez o Exercito Português que conta em Angola, ainda uns 25 a 30 mil homens ? Pois o Exercito Português não tem entrado directamente na luta, mas sem dúvida tem sido o grande vencedor.
Dado que Portugal, desde 25 de Abril mais propriamente desde Julho de 74, tem evoluído para um regime politico esquerdista, preparando com sábia determinação as condições para impor (a bem ou a mal) uma ditadura comunista, lógico seria que tudo fizesse para que Angola lhe seguisse as pisadas. E assim tem acontecido. Como em Portugal, em Angola é através das armas que o sistema se propõe impor. Mas em Angola haveria que salvar as aparências, não convindo uma intervenção directa das forças portuguesas, cujos quadros de comando foram previamente preenchidos por elementos de "confiança". Sendo assim, como tudo indica, teriam recebido instruções para dar apoio logístico (e não só) ao Movimento de cunho marxista em Angola - MPLA.
Todavia, aparentemente o Exercito Português apenas funcionou como medianeiro nas lutas locais. Quando numa cidade eclodia uma confrontação, a tropa portuguesa assistia alheia ao seu desenvolvimento até que um dos Movimentos mostrasse nítidas probabilidades de vencer.  Nessa altura intervinha como arbitro: se a facção prestes a ser derrotada fosse o MPLA, o comandante português imponha o cessar fogo, mas permitia que os contingentes de cada permanecessem nas suas Delegações e se reorganizassem com reforços; mas se fosse o MPLA o provável vencedor, então o comando português, além de ordenar o cessar fogo, obrigada o vencido (ou provável vencido) a entregar todo o armamento e evacuar a cidade. Estes dois casos aconteceram no Lobito: no primeiro estava o MPLA a ser vencido, no segundo saiu vencedor. Esse armamento apreendido seria, posteriormente, entregue pelo comando português às forças do MPLA, como até já publica e despudoradamente o anunciaram.
Deste modo o MPLA (digno representante  da actual linha política de Portugal) tem averbado vitórias sobre vitórias, embora se deva reconhecer, que em virtude das ajudas de todo o lado, é presentemente o Movimento com maior poder militar.