Lobito 19 Fevereiro de 1976

À míngua de acontecimentos de maior relevo, tento-me a breve análise das mutações internacionais sobre Angola, nas últimas semanas.
Podemos estabelecer o dia 22 de Janeiro passado como o do começo de nova fase da questão angolana. Nesse dia ocorreu em Moscovo a conferência entre H. Kissingir e Brejnev sobre a limitação de armas estratégicas e, eventualmente, sobre o caso de Angola, como já oportunamente anotei.
Apreciando, disse então que Kissinger (baseado nos correspondentes internacionais) fora desfrutado pelos russos ao pretender discutir Angola; e que, acto imediato, a África do Sul começou a retirar as suas tropas, desiludida pela falta de coerência americana e que foi esse o disparo de partida para o MPLA avançar imparavelmente por todo o território.

Hoje tenho a corrigir às minhas deduções de então, o que é natural em razão da escassez de informações que chegam a esta jaula onde me encontro.
Ao invés do que na ocasião supus, os russos não se teriam esquivado a discutir com Kissinger; acredito hoje que discutiram, e bem, o problema de Angola e que teriam chegado a soluções concretas. Quais? Ainda não sei.
O certo é que Kissinger fez posterior declaração pública (parece que estou a ve-lo a esfregar as mãos) de que o caso de Angola ficaria resolvido dentro de um mês. Dias depois, noutra declaração - creio que na Costa do Pacifico - terá afirmado que o "dossier" Angola estava encerrado.
Sendo assim, não seria só a desilusão que teria determinado a retirada sulafricana, mas também (e talvez principalmente) uma atitude concertada por conselho (ou até imposição?) dos Estados Unidos.
Certamente que os americanos, (pela sua abdicação) receberam formais garantias e promessas dos russos, que espero a seu tempo venham a público. Mas, por enquanto, tudo parece que, mais uma vez, foram lubridiados.
É já notório que os soviéticos são peritos em manobras diplomáticas e manejam habilmente os factores psicológicos. Se voltarmos atrás, vemos que são mais atrevidos e desenvolvem mais ousadas ofensivas nos anos de eleições nos Estados Unidos, pois contam com relativa inécia dos governantes deste país tementes de prejudicar a sua campanha eleitoral.
Para já, porém, regista-se um facto que parece incontroverso; salvo extraordinária coincidência não muito aceitável, a Conferência de Moscovo de 22 de Janeiro deu o arranque à mais sensacional viragem da posição militar angolana. A partir daí agigantou-se, de súbito, o poder ofensivo do MPLA; e a partir daí esvaziou-se, tambem de súbito, a capacidade defensiva dos outros Movimentos. Depois, depois continuou a rolar a bola de neve até ao domínio total do MPLA. E tudo aconteceu em escassas duas semanas.

(...) continua.