Lobito 26 Dezembro de 1975

Passou o Natal, a tradicional (direi quase universal) Festa da Família, quando se costuma respirar amor, concórdia e paz.

Doce tranquilidade de espírito...

Mas neste ano, para os Lobitenses o Natal foi diferente, virou no polo oposto. Foi um Natal de ódio, discórdia e guerra.

Amarga tranquilidade de espírito...

Na véspera, à tarde, ainda houve algum movimento na zona comercial, na faina das compras de prendas da ultima hora, esgotando o pouco que havia nos escaparates das lojas. Um ou outro movimento de tropas não alcançou perturbar a serenidade dos que se preparavam para comemorar a Noite Silenciosa.
As pessoas acabam por se adaptar aos ambientes mais hostis e o povo do Lobito parece que já se habituou à guerra; pelo menos já não reage em pânico como nos primeiros dias.

A noite entrou calma e as poucas famílias ainda existentes recolhem-se à placidez dos lares para comungar na ceia patriarcal e esquecer, por momentos ao menos, as agruras vividas e as visões de um futuro que se antolha sombrio e incerto. E tudo decorria sem tropeços a culminar na distribuição das prendas por entre a esfuziante alegria das crianças.
Infelizmente este quadro não ocorreu agora como regra...foi execpçao: a maioria dos lares está desfeita, as famílias estão ausentes e (o mais doloroso) sem noticias; ficaram apenas homens...sem lar.
Mas no final da consoada, já noite dentro, quando se trocavam "boas noites" e todos se dispunham a recolher, rompeu forte tiroteio para os lados dos morros fronteiros à baía. E em breve houve resposta de vários pontos da cidade.

O Lobito estava novamente em guerra acesa!

Por entre o matraquear das metralhadoras e espingardas automáticas toava o estampido dos canhões ou morteiros. Soube-se logo o que já se adivinhava: defrontavam-se pela supremacia os dois Movimentos que ocupavam a cidade desde o inicio de Novembro - FNLA/UNITA.
A luta continuou intensa noite fora e prolongou-se, mais atenuada, por toda a manha do dia 25. Mas cerca do meio-dia tudo silenciou. Tinha vencido a UNITA que ficou, deste modo, senhora absoluta do Lobito.
O contingente de forças Sulafricanas acantonado no Lobito não se intrometeu na refrega e adiante se dirá porquê.

(...)